Home > Estratégia > Como os pioneiros do Brasil estão disputando a liderança do mercado legal de apostas 

Como os pioneiros do Brasil estão disputando a liderança do mercado legal de apostas 

| By Kyle Goldsmith
Há poucos dias do lançamento do mercado legal de apostas online no Brasil, os operadores internacionais estão disputando posições no setor. Kyle Goldsmith pondera como as M&A e as parcerias de mídia podem moldar o mercado no curto prazo.
Brazil betting

Olhando para o lançamento das apostas nos EUA há seis anos, uma enxurrada de operações de M&A ajudaram a posicionar algumas das principais marcas de hoje, que se esforçavam para sair na frente naquele mercado tão aguardado. Poderia o iminente lançamento no Brasil espelhar algumas das tendências vistas nos EUA?

Um desses operadores foi a Flutter, cujo investimento em participação inicial foi de 37,2% no provedor de daily fantasy FanDuel em 2018 por R$ 4,18 bilhões, antes de aumentar sua participação para 95% em dezembro de 2020.  

Procurando explorar o mercado de apostas igualmente tentador do Brasil, a Flutter fechou em setembro um acordo para adquirir uma participação inicial de 56% no Grupo NSX da operadora local Betnacional por R$ 350 milhões. 

O grupo está entusiasmado com a oportunidade das apostas no Brasil e disse aos acionistas que continuará a adquirir marcas locais dentro de seu mercado-chave como parte de seu portfólio de marcas do tipo “herói local”.   

Os analistas estão extremamente otimistas com a Flutter. Chad Beynon, da Macquarie, previu em dezembro que a participação de mercado online do grupo no Brasil poderia crescer 150% em 2030, para 25%. Isso provavelmente a colocaria no topo do que se espera ser um mercado extremamente competitivo. 

A análise de Macquarie mostra que a empresa criou cerca de R$ 200 de valor incremental por ação para os investidores graças a nove aquisições desde 2019. Além de sua tecnologia Flutter Edge, o grupo listado na NYSE e seu trabalho em M&A podem atingir uma participação de mercado global de cerca de 20%, conforme a Macquarie.  

O aumento repentino da atividade de M&A no Brasil não é inesperado, pois a experiência e os produtos locais são extremamente valiosos nos mercados estrangeiros. Em maio, Adam Patterson, economista do consulado do Reino Unido no Brasil, apontou os altos custos regulatórios como um impulsionador para M&A no Brasil, enquanto a consultoria de jogos Ficom Leisure destacou o acesso a conhecimentos locais e avanços tecnológicos como principais benefícios de entrar no mercado via M&A.  

Obter essa posição local por meio de M&A é um fator-chave no Brasil, pois, por lei, os operadores devem ter um representante no local para apoiar sua licença. Enquanto alguns estão abrindo seus próprios escritórios em todo o país, a aquisição de operações já estabelecidas pode ser mais barata e fácil de administrar.  

Uma fonte consultora de M&A disse ao iGB que a Flutter estava insatisfeita com a administração de seus negócios na América do Sul a partir de um escritório em Portugal. A aquisição do Grupo NSX lhes deu acesso a operações no Brasil e a especialistas no mercado. 

A Ficom prevê que três categorias principais estão de olho em posições no mercado brasileiro. Incluindo gigantes europeus como Entain e Betsson, bem como empresas asiáticas que atuam como operadores no mercado clandestino e procuram reinvestir em mercados regulamentados, ou empresas listadas visando um desenvolvimento internacional. 

Uma abordagem cautelosa para entrar no espaço de apostas do Brasil  

Há ainda um terceiro grupo: marcas norte-americanas que buscam se expandir para o Brasil como parte de sua estratégia de crescimento internacional e se firmar em um mercado que pode ter algumas semelhanças com o dos EUA.

No entanto, o consultor de M&A acredita que algumas empresas norte-americanas possam demorar a entrar no mercado brasileiro. A DraftKings é um exemplo, pois parece não ter um desejo imediato de atuar no Brasil.  

Durante sua teleconferência de resultados do segundo trimestre, o CEO Jason Robins disse que não havia planos de entrar na região organicamente ou via M&A, embora, se o operador o fizesse, seria por meio de M&A. 

“Passei muito tempo conversando com DraftKings e Fanatics e eles disseram: ‘queremos atuar [no Brasil], mas precisamos estar lá desde o lançamento? Gostaríamos de saber quem vai ter sucesso, em vez de presumir que alguém já é bem-sucedido [no mercado paralelo]’”, disse a fonte ao iGB. 

É provável que muitos tenham aprendido com suas experiências no mercado dos EUA e optem por uma abordagem cautelosa após testemunhar o êxodo de operadores dos EUA neste ano. 

“Acho que você provavelmente verá mais M&A no segundo e terceiro trimestres do próximo ano. Os norte-americanos abrirão as carteiras e pagarão pela certeza, em vez de apostar na incerteza”, acrescentam.  

O modelo de parceria de mídia pode funcionar no Brasil? 

Uma gigante dos EUA que não perdeu tempo em garantir uma posição no Brasil foi a MGM Resorts International. Em agosto, o grupo firmou uma joint venture com o gigante da mídia Grupo Globo para lançar sua marca BetMGM no país e se beneficiar do vasto alcance do grupo midiático. 

O Grupo Globo é o maior grupo de mídia da América Latina, com uma rede de consumidores de cerca de 70 milhões de usuários diários em mídia de TV, digital, rádio e impressa. 

O acordo reabre uma conversa interessante sobre parcerias de mídia com operadores de apostas no Brasil, já que a tendência aparentemente não deu certo nos EUA.  

A Fox Bet, operada pela Flutter, fechou suas portas em julho de 2023 após quatro anos em operação, enquanto a Penn Entertainment relançou sua Barstool Sportsbook como ESPN Bet depois de vender sua participação na Barstool de volta ao seu fundador Dave Portnoy em agosto de 2023. Há também a MaximBet, que atuou por pouquíssimo tempo

Em ambos os casos, o desempenho decepcionou. Desde então, as partes interessadas do setor argumentam que o modelo de parceria de mídia não é uma rota segura para o sucesso, já que os consumidores de mídia esportiva provavelmente já têm marcas de apostas com as quais estão satisfeitos.  

No entanto, a Sky Bet é reverenciada no Reino Unido, e muitos tentaram recriar seu modelo de enorme sucesso. “É um caso interessante”, diz Andreas Bardun, fundador e CEO da marca brasileira de apostas local KTO.  

“Como sempre, tudo se resume à execução. Provavelmente há muito mais situações em que esses tipos de parcerias falharam. Se eles conseguirem, se forem ágeis o suficiente, serão um concorrente muito forte no Brasil”, diz ele sobre a parceria da MGM com o Grupo Globo. 

Mas Bardun reconhece que muitas vezes a colaboração entre duas grandes corporações pode ser sufocada pela burocracia e pelas negociações. Esse parece ter sido o caso na derrocada da Fox Bet. A Flutter e a Fox iniciaram um longo processo de arbitragem sobre a opção da gigante da mídia de adquirir uma participação maior na empresa de apostas quando a primeira adquiriu o Grupo Stars. 

A confiança do público é crucial 

Bardun espera que mais negócios surjam nos primeiros dias de lançamento no Brasil, embora acredite que a KTO estará entre os “grandes” nomes do setor, já que a empresa tem como meta uma participação de 10% no mercado brasileiro. 

“Haverá muitas parcerias e grandes avanços no Brasil, e gostaríamos de estar entre eles.” 

Há sugestões de que a KTO pode se tornar um dos principais exemplos para o futuro do M&A no Brasil, pois construiu uma posição sólida no país por meio de patrocínios locais e regionais.  

“A KTO é um dos poucos [operadores locais] que uma empresa de jogos listada pode comprar [ao considerar] operar conforme KYC, AML e todos os outros adoráveis anagramas”, diz a fonte.  

Udo Seckelmann, chefe de jogos de azar e criptomoedas do escritório de advocacia brasileiro Bichara e Motto Advogados, acredita que as parcerias com a mídia podem ajudar a aumentar o reconhecimento da marca e proporcionar uma grande chance de sucesso. 

Seckelmann diz que a longa e rica história do Grupo Globo no Brasil pode fornecer aos consumidores uma forte conexão com a marca BetMGM.  

“Se entendermos que essas empresas de mídia existem há muito tempo no Brasil, quando as pessoas veem que essa marca está conectada a um parceiro de apostas, acho que isso a fortalece e os consumidores podem se sentir mais seguros apostando nessas marcas do que em outras das quais nunca ouviram falar”, observa ele.  

Para Seckelmann, também se trata de confiança, que ele acredita ser culturalmente mais importante para os apostadores no Brasil do que no Reino Unido e nos EUA. 

Isso é especialmente importante ao considerar a pressão que o setor de jogos de azar online do Brasil tem sofrido ultimamente. Uma audiência de dois dias no Supremo Tribunal Federal (STF) em novembro procurou determinar se as leis de apostas no Brasil são inconstitucionais após semanas de reação política contra as apostas. O resultado dessa audiência será anunciado no primeiro trimestre de 2025.  

Essa preocupação decorre de uma série de relatórios divulgados no fim do ano que sugeriam que os consumidores poderiam estar gastando além do seu orçamento em apostas.  

Essa visão negativa das apostas foi agravada pelo longo atraso entre a legalização ser aprovada e os regulamentos serem formalmente divulgados este ano. Muitos argumentaram que essa demora impulsionou maciçamente a proliferação de sites ilegais.  

A confiança no mercado legal é, portanto, crucial para o setor ter sucesso e evitar mais retrocessos políticos. “Não podemos confiar em todos e em todas as marcas”, admite Seckelmann. 

“Acho que se a Globo e outras marcas de mídia estão chegando ao setor e dizendo ‘estamos com você há 50 anos, então pode confiar em nós’, [isso será um diferencial para a MGM].” 

A oportunidade dos negócios físicos 

Não é apenas no online que as operadoras estão olhando para M&A como um meio de entrar no Brasil. As apostas em negócios físicos também oferecem possibilidades atraentes. 

Embora a votação do Senado para aprovar formalmente as apostas físicas tenha sido adiada várias vezes para 2025, a expectativa é de que ainda seja aprovada. 

Isso oferece uma oportunidade para empresas como a Hard Rock International, que planeja entrar nos mercados físicos e online no Brasil. 

Alex Pariente, vice-presidente sênior corporativo de operações de cassinos e hotéis da Hard Rock International, disse ao iGB em setembro que o grupo provavelmente entraria no mercado via M&A. 

“Talvez seja uma joint venture, mas com certeza será algum tipo de parceria, porque esse é um modelo que a empresa vem buscando”, disse Pariente.  

“Estamos procurando ativamente e acompanhando o processo. Acho que é um pouco cedo, mas é muito provável que aconteça.” 

Sem uma bola de cristal, é impossível prever como será o mercado de apostas brasileiro. Mas o surgimento de jurisdições semelhantes, como os EUA, pode dar aos analistas uma ideia das tendências que funcionaram.  

É provável que a Flutter ganhe uma posição inicial no mercado, particularmente com o apoio de seu poder financeiro e tecnológico. O Brasil pode seguir o exemplo do Reino Unido e dos EUA, com a participação de mercado sendo dividida entre dois ou três atores principais.  

“É muito cedo para dizer quem vai ter sucesso”, admite o consultor de M&A. “Acho que especialistas em uma determinada área ou grupo demográfico têm uma boa chance. Mas se tentar ser tudo para todo mundo, será totalmente arrasado pela Flutter e pela Betano.”

Subscribe to the iGaming newsletter

Loading