Escândalos de manipulação de resultados podem abrir caminho para a regulamentação das apostas brasileiras
O Ministério da Justiça enviará uma proposta ao governo para regular as apostas esportivas, potencialmente trazendo um processo que começou em dezembro de 2018 a uma conclusão bem-sucedida.
Muitos temiam que o caminho para as apostas esportivas regulamentadas fosse bloqueado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, que não ratificou as regulamentações no final do ano passado, o que significava que o governo não havia regulamentado dentro do prazo de quatro anos estabelecido pela legislação de 2018.
Esta é a mais recente reviravolta em uma saga de mais de quatro anos desde que o legislativo do país votou pela legalização das apostas esportivas, tanto presenciais quanto online, em 2018.
A notícia foi publicada primeiro no blog do jornalista esportivo brasileiro Juca Kfouri, que citou José Francisco Manssur, assessor especial da secretaria executiva do Ministério da Fazenda do Brasil, como fonte.
De acordo com Luiz Felipe Maia, sócio do escritório Maia Yoshiyasu Advogados, nos últimos meses houve uma série de escândalos de manipulação de resultados que aumentaram a pressão pública por uma reforma e geraram uma resposta do presidente.
Sem regulamentação e com uma enorme quantidade de operações de apostas de fora do Brasil, as ligas brasileiras são presas fáceis para os fraudadores, diz Felipe Maia. Era questão de tempo até que isso criasse uma série de escândalos que poderiam resultar tanto na regulamentação quanto no fechamento do mercado.
Além disso, o advogado afirma que a regulamentação pode ser útil para outros fins também.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está sob muita pressão para buscar novas fontes de receita para o governo, ele diz. A regulamentação das apostas esportivas vem em boa hora.
Ministério envia proposta
De acordo com Neil Montgomery, sócio fundador do escritório Montgomery & Associados, Manssur é um advogado de São Paulo e especialista em direito esportivo, que esteve envolvido na legislação que criou a SAF Sociedade Anônima do Futebol, um modelo especial de constituição de empresas para organizações de futebol no Brasil.
Manssur já trabalhou no governo e é considerado confiável pelo partido governante dos Trabalhadores.
De acordo com Kfouri, o ministério enviará uma proposta para o escritório do chefe de gabinete do presidente na Civil Hill um escritório de nível ministerial no Brasil – para regular a oferta de apostas esportivas online no país.
Se aprovado pelo governo, o departamento promulgará uma medida provisória (MP), junto com uma série de portarias, que criará o regime regulatório para as apostas online no Brasil.
Segundo Montgomery, espera-se amplamente que a MP altere a lei das apostas esportivas do país para adicionar salvaguardas e penalidades adicionais.
Ela pode também alterar outras leis federais, incluindo a anacrônica Lei de Contravenções Penais, que contém as proibições gerais sobre jogos de azar no Brasil, diz Montgomery.
Ele acrescenta que, além da MP, o governo pode optar por emitir também um decreto assinando as regulamentações de 2018 do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que não foram assinadas pelo presidente anterior em dezembro. Isso poderia ser apoiado por uma Portaria adicional um documento legal do Ministério da Fazenda.
Uma MP é um tipo de decreto presidencial que tem força de lei e dura 60 dias, com a opção de estender esse período por mais 60 dias.
Para se tornar permanente, a MP precisa ser aprovada pelo congresso do país. As perspectivas de sucesso do pronunciamento tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado Federal ainda precisam ser avaliadas.
Esta é uma das preocupações em torno do processo: o governo pode perder o controle do processo legislativo e o resultado final pode ser diferente da proposta original, diz Felipe Maia.
A medida provisória também pode ser usada pelo congresso para acelerar as discussões sobre a legalização do jogo em geral.
De acordo com Montgomery, a MP provavelmente será enviada por volta de 27 de fevereiro, após o recesso de Carnaval.
As regulamentações
De acordo com Manssur, as regulamentações exigirão que os sites de apostas estejam sediados no país, ao contrário do atual arranjo, onde quase todos os sites de apostas online estão localizados no exterior.
Isso facilitaria o diálogo com o setor, a coleta de receitas fiscais e o processo de fiscalização.
A localização dos negócios de apostas no Brasil também permitiria ao governo ter maior poder no combate ao grau de lavagem de dinheiro dentro do setor o que é um objetivo chave da regulamentação.
O assessor especial afirmou que as principais partes interessadas já foram envolvidas no processo de regulamentação.
Essas consultas incluíram vários órgãos governamentais, incluindo o Ministério do Esporte, o Banco Central, a Polícia Federal e o Ministério Público.
Entidades esportivas como a Confederação Brasileira de Futebol e o Comitê Olímpico também estiveram envolvidas, assim como vozes da indústria e associações de apostas.
Manssur também indicou que o governo confiará em soluções tecnológicas fornecidas por fornecedores estrangeiros para inspecionar efetivamente o setor quanto a ofertas ilegais e casos de manipulação de resultados com apostas suspeitas a serem bloqueadas.
Se for tornado permanente, a publicação dessas regulamentações por parte do Ministério da Fazenda significará que as apostas esportivas online legalizadas no Brasil estão um passo mais perto de se tornarem realidade.
Última reviravolta
Após a aprovação da lei, o governo teve um prazo de dois anos para criar e publicar as regulamentações com a opção de uma extensão de dois anos adicionais, se necessário.
O governo deu à Secretaria de Avaliação, Planejamento, Energia e Loterias (SECAP) a responsabilidade de consultar a indústria para criar o regime regulatório. Após optar por uma prorrogação, o prazo final foi o 12 de dezembro de 2022.
Em maio de 2022, a SECAP publicou as regulamentações que incluíam uma grande taxa de licença de BRL22,2 milhões (£3,55 milhões/4,03 milhões/$4,3 milhões).
No entanto, o presidente precisava assinar as regulamentações finais para que a proposta da SECAP se tornasse lei.
O presidente Jair Bolsonaro optou por deixar as regulamentações finais sem confirmação, efetivamente vetando-as. Isso deixou grande parte da ambiguidade sobre o futuro das apostas esportivas no Brasil
Embora o plano inicial tenha falhado, Felipe Maia argumentou que talvez os esforços não tenham sido inteiramente em vão.
O trabalho feito pela SECAP nos últimos quatro anos certamente servirá de base para os atuais reguladores, diz ele. Especialmente se a intenção for regulamentar as apostas esportivas nas próximas semanas.
O que quer que aconteça a seguir, a publicação das novas regulamentações pelo Ministério da Fazenda significa que as apostas esportivas online legalizadas no Brasil estão um passo mais perto de se tornar realidade.